Nem tudo que flutua é boia
Por Lucia Maria Paleari
lpaleari@ibb.unesp.br
As investigações com nitrogênio líquido, e o conhecimento sobre os processos para obtê-lo, que adquirimos durante a visita dos integrantes do Clube de Ciências, da EMEF "Dr. João Maria de Araújo Jr.", ao Centro de Isótopos Estáveis, do Instituto de Biociências, da Unesp, de Botucatu (veja aqui e aqui), foram extremamente interessantes e de extrema importância, para dar suporte à compreensão dos fenômenos que seriam tratados nas atividades subsequentes.
Saber que
átomos e moléculas se agitam menos e podem se reunir quando são submetidos a maior pressão ou quando o ambiente esfria. Saber que átomos e moléculas se agitam mais
e podem se separar, quando há mais calor ou a pressão à qual estão submetidos
for menor. Esses conhecimentos ajudam a entender e explicar muita coisa que acontece bem diante dos
nossos olhos e para as quais muitos de nós não nos atentamos.
Por exemplo, o pedreiro sabe que precisa deixar um vão em certos locais em
paredes de prédios, pontes e entre os ladrilhos de um piso. Sem esses vãos,
podem acontecer rachaduras devido a dilatação dos materiais por causa do calor,
que faz com que as moléculas vibrem mais e se expandam. Pela mesma razão, é
preciso obedecer a certos procedimentos na construção de máquinas, na colocação
de trilhos de trens etc.
Essa nova
visão sobre o comportamento da matéria parecia satisfatória para os clubistas,
até que um novo desafio lhes foi proposto, como trabalho para ser realizado em
casa: encher um copo com água até a borda, colocar no congelador e, a cada meia
hora, observar atentamente o referido copo, até toda a água congelar.
Novo
encontro com os clubistas, momento de relatar as observações e procurar explicar o
que haviam observado em casa. Infelizmente, poucos atenderam à solicitação.
Destes, apenas um, mais cuidadoso observador, conseguiu perceber duas situações
especiais que ocorreram. Ele percebeu que quando a água ficou mais fria, pouco
tempo depois de colocada no congelador, apareceu um espaço muito estreito entre
a superfície da água e a borda do copo. A outra observação, que mais dois clubistas
conseguiram fazer, foi que, depois de congelada, a água que estava dentro do
copo havia ultrapassado um pouquinho a sua borda.
O que teria
acontecido com a água durante o tempo em que ficara no congelador dentro do
copo? Ela teria se contraído e depois se expandido? Será? Essa foi uma das hipóteses
aventadas. A outra hipótese foi das observações terem sido feitas sem o devido cuidado.
Afinal, se sob frio as moléculas se aproximam, como então a água poderia ocupar mais espaço, indo para fora do copo?
Afinal, se sob frio as moléculas se aproximam, como então a água poderia ocupar mais espaço, indo para fora do copo?
Para
obtermos uma resposta a esse impasse criado, precisávamos repetir a
experimentação de maneira simples, rápida e eficiente. Assim todos os
clubistas, inclusive aqueles que não fizeram o trabalho de casa, teriam a
oportunidade de conhecer um comportamento bastante peculiar da água. Para isso,
construí um material didático bem fácil de ser feito e utilizado, que será
descrito a seguir, para elucidar as dúvidas que haviam surgiram.
A Experiência
- Um tubinho de plástico retirado do interior de uma caneta esferográfica, depois de ter sido deixado totalmente vazio, sem qualquer resquício de tinta.
- Suporte para que o eppendorf fique na vertical, já que sua base é curva. Esse suporte pode ser um recipiente de plástico, cuja altura seja menor do que a do eppendorf, para não atrapalhar as observações, ou uma tampa na qual se deve fazer um orifício central para introduzir o eppendorf. Essa tampa só deve tocar uma superfície plana pela borda lateral, como na tampa da figura I, para que a base do eppendorf, introduzido no orifício central dela, fique suspensa e a montagem estável.
Preparo:
Corte a
articulação da tampa do eppendorf. Em seguida, faça um orifício no centro dessa
tampa, cuidando para que o diâmetro seja ligeiramente menor do que o do tubinho
da caneta, para que ele passe por ali com bastante dificuldade e fique muito
bem preso. Introduza o tubinho da caneta nesse orifício até que sua extremidade
atinja, aproximadamente, a metade do eppendorf. Tome cuidado para que o tubinho
não dobre, quando você forçar a sua passagem pelo orifício da tampa.
Finalizando os preparativos:
Coloque
água até a borda do eppendorf. Introduza, cuidadosamente, o tubinho nessa água
até que a tampa do eppendorf, à qual ele foi acoplado, possa ser fechada (com o
encaixe dela no tubo, ouve-se um clic). Quando esse procedimento é executado
corretamente, parte da água que está no interior do eppendorf sobe pelo tubinho
de plástico, até atingir um determinado nível, na porção que fica acima da
tampa. Com uma caneta de ponta fina, dessas usadas para escrever em CD, marque
o nível que a água (NA) atingiu dentro do tubinho (Figura I, Imagem A). Feito isso,
leve o conjunto para dentro de um congelador, que em seguida deve ser fechado, assim
como a geladeira e aguarde por cinco minutos.
Observação de fenômenos
muito importantes
muito importantes
Passados os
cinco minutos, abra o congelador e observe o nível da água no tubinho de
plástico. Ele deve ter ficado como a imagem B, da figura I. Esse novo nível abaixo
da marca feita com a caneta, confirma a contração da água.
O
comportamento das moléculas de água nessa primeira parte do experimento, foi
semelhante ao das moléculas de nitrogênio (veja aqui), que já havíamos
investigado anteriormente. Com o frio, elas reduziram a movimentação e se
aproximaram um pouco mais umas das outras, ocupando um espaço menor.
Na segunda
parte do experimento, depois de fechado novamente o congelador, a observação deve
ser realizada, após 15min ou 20min. Nesse momento, você verá que o nível da
água do tubinho ficou acima da marcação feita inicialmente com a caneta, como
se pode verificar na imagem C da figura I. Portanto, a água, surpreendentemente,
porque diferente do esperado, realmente se expande, como dois dos clubistas
haviam observado.
- Clube de Ciências Escola municipal "Dr. João Maria de Araújo Jr." - Botucatu
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Figura I
Infelizmente,
não dispúnhamos de um termômetro para verificar a que temperatura acontecia esse
comportamento especial da água, de expandir-se ao continuar esfriando. No
entanto, consultando bons livros, é possível saber que as moléculas de água vão
se aproximando umas das outras até o termômetro registrar 4 graus Celsius (4°C).
Abaixo dessa temperatura, as moléculas, ao invés de se aproximarem mais umas
das outras, se arranjam de um jeito especial e a água passa a ocupar mais
espaço, a expandir, como nos mostra a figura II, abaixo.
Figura II
Isso
significa que abaixo de 4°C, até congelar, a água fica mais
leve. Por essa razão, o gelo se forma de cima para baixo e flutua sobre a água
líquida (Veja imagem D, da figura I).
Essas
peculiaridades da água são fundamentais para que os seres vivos, que habitam lagos
de grandes profundidades, tenham chance de sobreviver ao inverno rigoroso de
regiões temperadas, quando as temperaturas caem bem abaixo de zero grau Celsius e as
superfícies dos lagos ficam congeladas. Sobre esse assunto falaremos no próximo
post.
* Paleari, L. M. e
Chiarelli, A. Por que o gelo flutua?
São Paulo: Fundação Editora Unesp, 2000.
Sugestão:
Se você quiser saber mais sobre outras
atividades do Clube de Ciências, acesse os links:
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