quarta-feira, 4 de setembro de 2013

PERCALÇOS DE UM CIDADÃO
Por Lucia Maria Paleari

Artigo publicado pelo
Dário da Serra - Botucatu
24 de agosto de 2013


Não há espaço de educação ambiental em que não se discutam questões sobre as grandes formações vegetais como a floresta Amazônica, o Cerrado, a Floresta Atlântica, mata ciliar e animais a serem protegidos da extinção. E eu me pergunto constantemente: Por que não tratar com o mesmo interesse e insistência a desflorestada área urbana das cidades, que a cada dia acolhe e protege menos os seus habitantes?
 
Das muitas questões ambientais relativas a esses espaços há algumas que, de tão triviais e desconsideradas em uma sociedade destituída de cidadania, passaram a fazer parte da 'norma', apesar do desconforto e riscos que nos impingem.
 
Experimente pensar em alguns trajetos que tenha feito a pé recentemente. Quantos deles estão devidamente arborizados, com as plantas embelezando e refrescando os espaços impermeabilizados com concreto e asfalto? Durante essas caminhadas, quantas vezes você, automaticamente, precisou sair da calçada para caminhar pela rua ou se desequilibrou e até caiu? 
 
São buracos; desníveis em passagens feitas para favorecer a entrada de automóveis em garagens; montes de areia e pedras esperando pelo início ou conclusão de obras; carros esperando por reparo em oficinas mal aparelhadas, ou esperando pelo morador que antes de estacioná-lo corretamente opta por fechar o portão da residência; águas pluviais e da limpeza de quintais escoando do alto ou da base de muros diretamente sobre o transeunte; vendedores ambulantes; barracas de sanduíche e inúmeras outras situações de desconforto e perigo.
 
Já repararam em tapumes de obras, que muitas vezes são colocados no limite da sarjeta, bloqueando a passagem do pedestre pela calçada?
 
Se uma pessoa gozando de excelente condição física não consegue caminhar com tranqüilidade e segurança por caçadas que deveriam ser planas, em um único nível e desobstruídas, como se sente um idoso ou uma pessoa com deficiência passageira ou permanente, tolhidos no direito básico, garantido pela constituição, de ir e vir com segurança?
 
Não há mais normas a seguir? Cada qual faz o que bem quer sem atenção aos demais munícipes? O poder público fiscaliza como deveria?
 
E as coisas não param por aí. Quantas vezes você se sentiu ameaçado por motoristas deseducados e ignorantes, que imaginam saber dirigir porque têm uma habilitação e que, não raro, desconhecem diversas leis de trânsito? Motoristas esses, que em geral também são incapazes de estacionar com adequação e acabam por ocupar mais do que uma vaga em estacionamentos de lojas e supermercados. Infelizmente, são comportamentos hostis disseminados em todas as classes sociais.  Comportamentos que independem de carro importado, de roupas de marca e patrimônio invejável, mas, sim, de civilidade, cultura, elegância.
 
Se quisermos recuperar o nosso bem-estar e a nossa sanidade, deprimida devido a tantos desrespeitos e agressões diários, se quisermos ter o prazer de caminhar por uma cidade aprazível e acolhedora, temos de urgentemente aprender ou reaprender, o sentido do bem comum e a arte de conviver. Incapazes de valorizar o espaço público e de olhar para além de nós mesmos, estamos fadados ao desespero, aos confrontos fortemente agressivos por motivos fúteis e aos estados de depressão, hoje responsáveis por agendas médicas lotadas e bons faturamentos de laboratórios, com a venda de antidepressivos.
 
 
 Lucia Maria Paleari
Bióloga, Doutora em Ecologia
Docente da UNESP – Instituto de Biociências
Departamento de Educação - Botucatu
                                                                                                        lpaleari@ibb.unesp.br